sábado, 11 de julho de 2009

Per Deus, Amors, mal sabes traire!


Um sorriso é inevitável ao registrar o duplo sentido das palavras de Paolo sobre São Francisco de Sales: "um santo de hoje". De fato, São Francisco (1567, Thorens -1622, Lyon) faleceu nas décadas vividas ou lembradas por Paolo, personagem típico - ou assim visto alguns séculos depois - da Contrareforma. Nobre de família, São Francisco realizou sua vocação política e intelectual apenas na Igreja Católica, à qual emprestou a verdade de suas palavras e mais ainda a de seus atos. Há uma certa expediência aristocrática na forma com que dispensa questionamentos teológicos mais profundos, em moda nos tempos da Reforma, em favor da manifestação do amor a Deus e ao próximo. Sua Introdução à Vida Devota lembra que a santidade está disponível para qualquer um, em qualquer situação, não é uma questão ritual ou misteriosa. Foi canonizado em 1665, por Alexandre VII; proclamado Doutor Universal da Igreja por Pio IX em 1877.

Afinal, a realização da obra de caridade sobrenatural não é uma questão de número, de emoções, de sentimentos, mas de agir com a mente em Deus. Logo no capítulo 3 da Introdução ele esclarece: É um erro, mais ainda, uma verdadeira heresia, procurar banir e vida devota da sala de guarda do soldado, da oficina do trabalhador, da corte do Príncipe ou da cozinha doméstica. Naturalmente, uma devoção puramente contemplativa, tal como é própria do religioso e da vida monástica não pode ser praticada nessas vocações, mas há vários outros tipos de devoção bem adequadas aos que vivem uma vocação secular, pelos caminhos da perfeição (parágrafo 11).

Curiosamente, os tempos modernos revelam-se, em comparação, quase medievais: só acreditam na santidade diante de evidências de excentricidade pessoal ou de prodígios midiáticos (pedem um sinal, como observou Jesus). Ou seja, acreditam apenas em celebridades. Além disso, preferem, antes do que a caridade, a idéia de justiça social, que exime os beneficiados do sentimento de ser objeto de uma atenção especial e transforma os caridosos em meros reparadores de uma injustiça. Uma forma cínica, sem culpas nem remorsos, de considerar a desigualdade entre os homens.

(Imagem: São Francisco de Sales, autor desconhecido, final do século XVII)

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