quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Ben fes erras d'enamorat



A busca pela cidade celestial segue estranhos caminhos.Robert Hindmarsh (1759-1835), tecnicamente um discípulo do místico sueco Emanuel Swedenborg (1688-1772), foi o fundador do primeiro grupo de seguidores de suas doutrinas. Originalmente um pregador metodista, converteu-se ao ler Céu e Inferno e em 1783 publicou um anúncio de jornal promovendo um encontro de interessados em Swedenborg. O sucesso foi de tal ordem que em janeiro de 1788, seu primeiro sermão foi lido em uma capela alugada em Eastcheap, Londres.

A partir de 1790, Hindmarsh começou a publicar seu The New Magazine of Knowledge concerning Heaven and Hell, and the Universal World of Nature, misturando as doutrinas de Swedenborg com ocultismo e ciências naturais. Condenava, porém, a astrologia, a mágica e as artes divinatórias em geral. Reencarnação também era negada. Chefe da Society for Promoting the Heavenly Doctrines of the New Jerusalem, Hindmarsh adotou várias formulas do Metodismo para tornar suas doutrinas mais aceitáveis e, de fato, passou a contra com a colaboração da London Theosophical Society, outra organização swedenborgiana.

A comunidade religiosa prosperou ao longo do século XIX e missionários foram enviados aos Estados Unidos. A literatura básica sobre a nova Jerusalém é composta por Godwin, Joscelyn. The Theosophical Enlightenment. Albany: State University of New York Press, 1995; Hindmarsh, Robert. Rise and Progress of the New Jerusalem Church in England, America, and Other Parts…. Edited by Edward Madeley. London: Hodson & Son, 1861; e Sigstedt, Cyriel Odhner. The Swedenborg Epic: The Life and Work of Emanuel Swedenborg. London: The Swedenborg Society, 1981.

Imagem: Robert Hindmarsh. Rise and Progress of the New Jerusalem Church (1861).

sábado, 21 de novembro de 2009

Non habemus hic manenten civitatem

Considera, che questa misera terra non è altrimenti la Città sua permanente. La tua Città è il Paradiso. Como diferentes são tuas cidades: a presente e a futura. Considera como deves te comportar em uma terra onde és forasteiro: não te apegues. Vê como coisa que não te toca. Não és apenas forasteiro, ès peregrino. Que fazes quando passas em peregrinação? Não te ocupas de levar coisas, de andar carregado, levas apenas o necessário. Ma oimè: quanto procedi diversamente! Appena pensi mai al Paradiso: cattivo segno. Non dovrá dunque quella essere la tua Patria.

(febbrajo xx, Hebreus 13. 14)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

en sa cambra per repousar

Prop. XXXVI. O amor intelectual de Deus é o amor com que Deus ama a si mesmo, não enquanto é infinito, mas enquanto ele pode ser explicado por meio da essência da mente humana considerada sob a espécie da eternidade; em outras palavras, o amor intelectual de Deus é parte do infinito amor com que ama a si mesmo.

Prova.- (1) Este amor deve ser relacionado às atividades da mente (V:xxxii.Coroll. and III:iii.); é ele mesmo uma atividade pela qual a mente vê a si mesma acompanhada pela idéia de Deus como causa (V:xxxii.&Coroll.); que é (I:xxv.Coroll. and II:xi.Coroll.) uma atividade por onde Deus, enquanto pode ser explicado pela mente humana, vê a si mesmo acompanhado pela idéia de si mesmo; portanto esse amor é parte do infinito amor com que Deus ama a si mesmo. Q.E.D.

Corolário - Daí segue-se que Deus, na medida em que ama a si mesmo, ama o homem e consequentemente o amor de Deus pelos homens e o amor intelectual de Deus são idênticos.

Bento de Spinoza, Ética, Livro 5.

Qui prodest homini, si mundun

Considera la differenza notabile, la qual passa tra 'l nostro amore e 'l Divino. Noi ci moviamo ad amare uno perch'egli è buono: Iddio si muove ad amarlo, non perchè é, mas perchè vuol fare buono. Deus é como um escultor que vê passar um tronco em uma corrente: não vê a madeira informe, mas a obra de arte que pode fazer. Assim como está em Jeremias 31. 3 (Há muito que o Senhor me apareceu dizendo: Pois que com Amor eterno te amei, também com amorável benignidade te atrai). É assim o Amor de Deus: não tem princípio na beleza, na doutrina, na riqueza, mas na caridade. É um Amor perpétuo e antigo como Deus. Desde que Ele é Deus, está enamorado de ti. Eternamente pensa em ti. Se tanto falas bem de um Príncipe - o que não deverias falar de Deus, que te amou desde antes do Mundo. Vê como sempre te ajudou a fazer o Bem, não respeitando a rebeldia de tua vontade, mas testando-a. Considera a infinita misericórdia: podia te abandonar e não o fez. Deves um dia ceder e trazer outros à salvação; pois ele não quer salvar apenas a ti, mas muitos. Perchè in qual forma ti poteva egli mostrare maggior affetto, che mentre ti ha salvato per renderti salvatore? Questa sí, ch'è stata un'eccelsa misericordia.

(febbrajo xix, Jeremias 31. 4)

sábado, 14 de novembro de 2009

No.us penses pas ses lums anes

Aproximando-se do fim do mês de fevereiro, as anotações de Segneri começam a perder em variedade. A citação implícita a uma estampa e a referência à Física do estagirita não escondem o recurso menos intenso à vida dos Santos e o uso da repetição de sinômicos como instrumento retórico. Segneri parece obcecado com a necessidade de defender a eternidade da punição infernal como a retribuição aos que se deixam seduzir pelos encantos desse mundo. Essa aridez ressalta uma indagação natural sobre a efetividade de seu texto e sobre a identidade de seu leitor.

Não seria certamente o camponês italiano, frequentador das missas espetaculares que oficiava no curso de suas missões. Não seria o público ilustrado urbano. Não há também qualquer esperança de posteridade em suas linhas. Talvez escrevesse para seus colegas predicadores, mas o Maná não funciona, ao menos até aqui, como um repositório de argumentos, nem possui a erudição necessária para impressionar jesuítas. Suas anotações, nem de longe, possuem o fogo de um sermão de Antônio Vieira.

O Maná talvez seja escrito para aqueles fiéis, funcionalmente alfabetizados, incluídos na cultura e no hábito do livro, e, assim, não queira convencer ninguém: apenas reforçar uma Fé preexistente. Considera, escreve ele sempre ao começar sua anotação. Suas repetições, sua falta de originalidade, sua ortodoxia sem maior sofisticação estariam plenamente justificadas: não quer convencer a quem não quer ser convencido.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

confortamini in Domino et in potentia virtutis eius.

Considera, quanto è vero, che mai non devi portar punto d'invidia alla prosperità de' Cattivi. Vivem alegres, mas por poucos anos. Quanta amargura continuamente engolem aqueles mesmos, que buscam satisfazer todos os seus desejos! Veja como terão de descontá-los. Pelo desafogo que deram à Soberba serão confinados no mais profundo báratro do Inferno, a estar eternamente escravos de Satanás; à Avareza, a permanecer terrivelmente pobres; à Luxúria, devorados por escorpiões e serpentes; à Ira, serão insultados para todo o sempre, à Gula, estar em perpétua fome, à Inveja, contemplar os que humilharam ou vitimaram; e à Preguiça, estarão sepultos em uma imobilidade terrível, exilados de Deus. Considera como essa transição será rápida, do trono à escravidão. A causa é o peso do Pecado, que logo os põe na ruína do Inferno antes de sentirem que estão a arruinar-se. Todas as coisas seguem ao Centro, sem necessidade de impulso extrínseco e assim vão as culpas prontamente a encontrar as penas. Tu che vuoi fare? Sarà dunque vero, che non ci sappi finire ancor di risolvere a porsi a salvo.

(febbrajo, xviii. Jó 21. 13 Ducunt in bonis dies suos )

sábado, 7 de novembro de 2009

si con fais austors a perdriz



Le Chesne sert premier de gland, puys d’ombre,
De Jupiter l’arbre ha des biens sans nombre.
Avant les bledz trouvéz, Les anciens vivoient
de gland de chesne, & puys se reposoient des-
soubz en l’ombrage, & pource consacroient
le Chesne au souverain Dieu Jupiter, qui leur
donnoit d’enhault nourriture, & repos. Ce
que signifie la beneficence de Dieu estre telle,
que apres le fruict d’icelle receu, encore en sert
l’ombre, & memoire, comme faict la loy de
Moyse, & les Prophetes, à l’Evangile.

Imagem: Andrea Alciato, Emblémes (1549).

et cum compleretur dies Pentecostes

Considera, che chi dice tutto non esclude niente. Tutto ciò che tu fai, non solo di pio, ma ancora d'indifferente, tutto da te dev'essere indirizzato all'onor di Cristo. Deves enriquecer em mérito e assim transformar a lama em ouro. Ó se soubesses quanta infelicidade è a tua enquanto trabalhas para teu prazer. Não és de ti, mas todo de Deus. Tua intenção é como a coluna de fumaça que sobe olorosa ao céu, mas que qualquer vento pode desviar. Seja um rio grato, mas rio: reporta ao Mar o que do Mar te foi dado. Ma non so come i più degli huomini pajono tanti animali, che se ne stiano di sotto una quercia a pascerci di quelle ghiande, che di là cascano in abbondanza si grande, e ne pur alziano gli occhi a rimirare una volta chi lor le dona, tanto è lunghi, che la ringrazino.

(febbrajo xvii, Colossenses 3. 17)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

con si santi ezercizii si giungeva l'ultimo giorno

O ponto alto das procissões rituais conduzidas por Paolo era a missa. De forma dramática, o sacerdote surgia portando uma coroa de espinhos e praticava a auto-flagelação no púlpito, com grande abundância de sangue. A reação registrada por seu biógrafo é ao mesmo tempo convencional e inevitável: a imensa lista de arrependidos como as prostitutas, os assassinos de estrada e os judeus.

Segneri também organizava cultos noturnos e missas campais. As procissões de flagelantes tinham no pregador uma figura de destaque, andando com cadeias nos pés, etc. Ao longo das cerimônias, ele queimava cartas de jogo, condenava brutalmente os pecadores e repetia a flagelação. Quando contestado por seus amigos e pares, dizia: a eternidade se aproxima. Sua ação provocava mesmo a ira do inferno: um espírito expulso de uma mulher não o deixou dormir, certa vez, batendo portas por toda a noite (pág 70).

O resultado de todo esse zelo era uma verdadeira epidemia de confissões, com filas e filas de gente buscando o sacramento. Tarefa, aliás, que cabia a seus irmãos jesuítas. Os problemas de surdez de Segneri não lhe permitia receber a confissão, a não ser em ambientes preparados, onde o fiel poderia falar em voz mais alta.

Ragguaglio, Caps 13 a 20.

quar donna es cuberta res

Dídimo, o Cego (313-398), professor de teologia em Alexandria, foi condenado por defender a salvação universal, o Evangelho segundo os Hebreus e a transmigração das almas no Terceiro Concílio de Constantinopla (680). Tertuliano (160-220), primeiro escritor cristão latino segue fora da hoste dos santos por seu extremo rigorismo moral e montanismo. Orígenes (185-254) também sofreu a condenação da Igreja pela crença na salvação universal.

Um tese que, como se pode notar, causa grandes constrangimento a Segneri.



Imagem: ícone de São Dídimo, o cego, considerado como tal por igrejas ortodoxas.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Habemus autem thesaurus istum in vasis

Considera, quanto gran fatica ci vuole ad alzar di terra um alto Edifizio spirituale, quanti atti di annegazione vi si richieggono, quanti di ubiddienza, quanti di umiliazione, quanto di mortificazione ancora austeríssima. E como tudo pode arruinar-se em um átimo. Basta um pecado mortal, mesmo em pensamento. Medita na queda de Dídimo, de Orígenes, di Ozio, de Tertuliano de outros que tanto bem fizeram. Tu que não hás praticado sequer uma parte desse bem, não deves temer por ti? Deus sempre pode negar a graça, tuas obras não O obrigam. Mesmo teu mérito é dom de Deus. Sempre hás de ter em mente a necessidade da ajuda de Deus e, portanto, pede sempre. Se tu resti di dimandare com grand’ardore, è cattivo segno; è segno, che non hai da salvarti.

(febbrajo xvi, Eccl 27.4)