quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Guillems es a vespras vengutz


Por uma curiosa coincidência, Isaac Fieri registrou a força do texto de Segneri e, em seu blog, havia uma referência ao mesmo experimento mental: o filme Groundhog Day (1993), escrito por Danny Rubin e Harold Ramis. Condenado a repetir o mesmo dia, o personagem de Bill Murray primeiro vive um pesadelo, tenta se matar várias vezes, mas aceita a redenção que, na leitura contemporânea, envolve realização romântica e a prática de pequenos atos de benevolência. O roteiro examina, ademais, com grande perspicácia o problema teológico da repetição e da redenção: ela proporciona o exame da própria vida, sempre evitado pelo personagem de Murray.

Há outro ângulo do experimento, também examinado pelo cinema em Retroactive (1997), escrito por Michael Hamilton-Wright, Robert Strauss e Phillip Badger. Nesse caso, Karen assiste um assassinato e, por meio de viagens no tempo, retorna ao mesmo ponto e tenta alterar o curso dos eventos, mas eles sempre se repetem para o pior. Repetir a vida de uma forma rendentora exige que você esteja no comando dos fatos - o que nem sempre é realista. Nada garante que um condenado à danação volte à vida e consiga corrigir seus caminhos, como sugere Segneri.

Muito depende da consciência de viver uma segunda chance. Há um célebre episódio de Star Trek New Generation em que a Enterprise está condenada há um ciclo catastrófico que repete, sem saber que está repetindo. Nesse caso, a passagem do tempo é neutra e o roteirista teve de inventar um recurso extraordinário para que o comando da Enterprise percebesse que estava preso em uma armadilha temporal.

Ora, se tudo depende da consciência, Segneri está correto em apelar para um thougt experiment. Imagina, nesta vida, que podes reverter o seu curso, como se começasses uma outra.

Pós-escrito: O episódio de Star Trek New Generation é Cause and Effect, número 18 da quinta temporada, exibido em 23 de março de 1992. O roteiro é de Brannon Braga e traz a Enterprise presa em um time loop. A tripulação descobre que está em um ciclo catastrófico que se repete, mas precisa receber uma mensagem que lhe indique como sair do ciclo. Data e Riker tem suas alternativas, mas Data percebe que a sua é mero fruto de uma memória e não uma mensagem. Adota a saída de Riker e a Enterprise evita a colisão com a Bozeman. A primeira nave estava no loop há 17 dias; a segunda, há oitenta anos. Uma vez mais, é preciso a consciência correta de uma repetição temporal para que seja evitada a catástrofe. Ou o Inferno, como quer Segneri.

3 comentários:

  1. Obrigado pela menção ao meu tosco post. Sua análise sobre o filme foi precisa, curta e objetiva! O contrário da minha...O segundo filme que você citou ainda não assisti...Parece interessante (embora eu tenha lembrado do Efeito Borboleta.)

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  2. Há outro exemplo famoso, o soviético "Solaris", em que o personagem principal assiste várias ressurreições da mulher por quem era apaixonado e que se matou por ver-se abandonada. Ele continua abandonando-a e ela continua se suicidando. Há uma refilmagem recente, que destaca o mesmo problema: a repetição da vida.

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  3. Ainda não assiti "Solaris". Já tinha ouvido falar...Mais um para a lista...Obrigado!

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