A emoção da esmola é reprimida no Brasil há quase um século, desde o momento em que o governo assumiu a responsabilidade pelas caixas de asssistência. A caridade medieval, em suas múltiplas formas, perdeu sua base moral e mutual para o Estado de bem estar. Hoje a caridade é parte da política fiscal: as isenções amparam desde as decisões individuais de dar até a atividade organizada das Igrejas. Há propaganda governamental na televisão recomendando não dar esmola. Os pobres estão obrigados a ser indivíduos. Os governos podem dar esmola, mas de forma anônima e universal. Governantes, no Brasil, não podem dar esmolas: são consideradas abuso do poder econômico em cortes eleitorais. Há um projeto de lei, por esses dias, no Congresso, eximindo de dolo os doadores de alimentos que, eventualmente, causarem problemas de saúde. A existência da esmola tem implicações políticas intoleráveis e mesmo a Igreja trabalha hoje para intermediar a relação pessaol entre quem doa e quem recebe.
Essa notável conquista ideológica torna ainda mais chocante as palavras de Paolo sobre o menino pobre que encontrou em uma peregrinação a Loretto(http://paolosegneri.blogspot.com/2009/05/sinite-parvulos-venire-ad-me.html). A idéia de que o eventual doador, o esmoler, uma palavra hoje morta, prefere o pobre que se adianta a pedir; a idéia de que esse mútuo sentimento - mover-se a pedir de forma graciosa, dar a quem lhe pediu pessoalmente - seja meritório e benigno; seriam quase escandalosas aos olhos modernos. O ato de pedir (um pedir real) está cercado de tal pudor, de tal protocolo, que se tornou quase proibido, coisa de quem não se respeita. Mesmo os pais têm obrigação de dar coisas aos filhos.
A reflexão de Paolo, contudo, vai muito além de confrontar suas emoções barrocas e nossa sensibilidade moderna. Sugere que essa relação entre esmoler e o pobre é a mesma entre Deus e o fiel. Ousa compreender o amor de Deus - é o esmoler riquíssimo, generoso, que, por nos amar, quer ouvir nossa voz, quer sentir nossa aproximação, pedindo. Tanto melhor se pedindo as coisas que são de Deus e não os bens da Terra, que qualquer monarca secular pode conceder. Difícil comentar essa reflexão, necessario é meditar sobre ela.
Parecerá talvez menos escandalosa se anotarmos o fato de que cem anos de repressão política e simbólica da esmola não fizeram desaparecer essa emoção. Campanhas de doação de agasalhos se repetem, criou-se mesmo um novo nome - solidariedade - para o atendimento individual, personalizado, das carências humans. Talvez o Estado não seja tão eficiente assim no atendimento aos pobres, talvez a miséria humana seja individual demais para ser atendida em uma escala administrativa ou talvez exista mesmo a emoção de dar. A mesma que leva voluntários ingleses a incomodar mais de uma vez, levando refeições no curso de uma noite fria, ao mesmo homeless. Considera, portanto, como recomenda Paolo.
quarta-feira, 27 de maio de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário